Um fragmento de
proteína pode ser uma importante arma contra o câncer. É o que foi descoberto
numa pesquisa da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP. O
trabalho do biomédico Antônio Carlos Borges demonstra que um pedaço da miosina
Va — proteína motora responsável pelo transporte de algumas organelas —, quando
expresso individualmente, inibe o crescimento de tumores.
A tese de
doutorado "Expressão de um fragmento da Miosina Va inibe o crescimento de
tumores de melanoma induzidos em modelo animal", orientada pela professora
Enilza Maria Espreafico, buscou testar o efeito antitumoral de uma sequência da
proteína estudada. Para isso, foram produzidas células tumorais capazes de
expressar o fragmento e, em seguida, utilizadas para induzir tumores em
camundongos.
“Tentando fazer
uma analogia, a miosina seria como um trem de carga com seus vagões,
deslocando-se sobre trilhos. Nestes vagões poderiam ser transportadas diversas
cargas, como moléculas, vesículas e organelas, inclusive “cargas perigosas”,
como os fatores pró-apoptóticos. Se esses fatores pró-apoptóticos ‘caíssem dos
vagões’, seriam capazes de induzir a morte da própria célula”, explica.
“O que fizemos em
nosso trabalho foi forçar a célula tumoral a fabricar ‘um vagão de cargas
perigosas’, isto é, um fragmento da miosina Vá, desengatado do trem. Assim, as
‘cargas perigosas’ ficam livres dentro da célula para provocar a morte da
mesma.”
O resultado do
estudo em animais foi satisfatório. Depois de 28 dias, enquanto quase 90% dos
camundongos do grupo cujos tumores possuíam o fragmento de miosina continuavam
vivos, pouco mais de 60% dos camundongos do grupo que tinha tumores normais
haviam sobrevivido.
A medição do
volume dos tumores também aponta resultados mais animadores. “Verificamos que
os tumores expressando nosso peptídeo cresceram significativamente menos que
tumores que não expressam”, diz o biomédico.
Borges ressalta
que o resultado é de certa forma, surpreendente, já que os resultados in vivo
com os animais superaram os efeitos observados in vitro, feitos em tubos de
ensaio, apenas com as células, o que nem sempre acontece.
A aplicação
prática do princípio, avaliado pelo pesquisador como uma “ferramenta
promissora”, no entanto, ainda está longe de ser alcançada. Ele afirma que
outros pesquisadores do Laboratório de Biologia Celular e Molecular do Câncer
da FMRP continuam trabalhando nesse sentido, mas o uso do fragmento no
tratamento do câncer só deve ser obtido em longo prazo.
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