A 5ª Turma Cível do TJ (Tribunal de Justiça) do Distrito Federal condenou a Fundação Hemocentro e a capital a pagarem, solidariamente, o montante de R$ 100 mil de indenização por danos morais a uma paciente contagiada pelo vírus HIV durante realização de transfusão de sangue em cirurgia de grande porte. Os réus terão ainda que arcar com pensão vitalícia equivalente a 3 salários mínimos, devida a partir do evento danoso, ocorrido no ano de 2001.
Os pais pediram na Justiça a condenação dos requeridos ao pagamento de R$ 500 mil de indenização por danos morais e pensão vitalícia a título de danos materiais.A autora da ação é menor de idade e foi representada pelos pais. Segundo narram, em 2001, com apenas dois meses de idade, a recém-nascida teve que se submeter a uma cirurgia de grande porte, na qual recebeu transfusão de sangue. A cirurgia foi realizada no HRAS (Hospital Regional da Asa Sul) e o sangue fornecido pela Fundação Hemocentro de Brasília. No procedimento, a bebê contraiu o vírus da AIDS, fato admitido pelos réus.
Em contestação, o DF arguiu, em preliminar, ilegitimidade passiva para constar na lide. Em relação ao mérito, sustentou que a fundação adotou todas as providências necessárias à coleta e ao fornecimento de sangue. Alegou a ocorrência de fato fortuito, já que a presença do vírus não foi detectada porque o doador estava na fase denominada janela imunológica, o que excluiria a responsabilidade civil do Estado. Contestou ainda os valores pedidos a título de indenização material e moral, informando que a criança faz tratamento na rede pública de saúde.
Na 1ª instância, o juiz da 6ª Vara da Fazenda Pública do DF julgou improcedentes os pedidos dos autores, que recorreram da sentença à 2ª Instância do TJ-DF.
De acordo com a decisão de 1º Grau: "A transfusão de sangue aconteceu no dia 23.08.2001, sendo que o teste conhecido como NAT, capaz de reduzir a janela imunológica de 22 para 11 dias, só foi homologado no Brasil em julho de 2002, após o reconhecimento da FDA (Agência de Drogas e Alimentos dos Estados Unidos), em fevereiro de 2002. Se à época dos fatos, não havia testes, nem elementos possíveis de avaliação e detecção da contaminação, não há como impor a responsabilidade ao Estado, devendo ser reconhecido à causa de força maior".
O colegiado da 5ª Turma Cível, por maioria, considerou devidos os pedidos de indenização por danos morais e materiais e afastou a tese de fato fortuito. Prevaleceu o voto do relator, que condenou o DF e a Fundação Hemocentro a pagarem solidariamente os valores indenizatórios.
Segundo o relator, é inegável o fato de a autora foi infectada pelo vírus HIV, decorrente de sangue contaminado, fornecido pela fundação ré, conforme os documentos juntados. Portanto “não vingam as alegações de que a contaminação decorreu de caso fortuito, uma vez que o sangue foi coletado durante o período denominado ‘janela imunológica’ do doador. E a contaminação poderia ter sido evitada, caso fossem adotadas medidas de segurança periódicas, com a realização de testes imunológicos sucessivos, o que não se fez na hipótese dos autos”.
Ainda aponta que o fenômeno “janela imunológica” é fartamente documentado pela literatura médica, o que descaracteriza a “imprevisibilidade” necessária à configuração de caso fortuito ou força maior.
Na sentença, houve divergência em relação ao pensionamento vitalício e à condenação do DF. Um dos vogais entendeu que o DF não é parte legítima para constar do pólo passivo da ação, bem como que não foram comprovados os danos materiais e consequente necessidade de pensionamento vitalício. Quanto aos danos morais, os julgadores foram unânimes em relação aos termos da condenação.